sábado, 19 de novembro de 2011

Uma visita horripilante

Tinha sido um domingo bem agitado por aqui. Os netos brincando e os adultos falando todos ao mesmo tempo, como de hábito. Já estava só,  organizando o apartamento antes de me deitar quando ao passar pela sala me deparo com a estranha visita.
Quietinha, bem ao pé da "cadeira do vovô" que já não tem mais o vovô mas está ali na sala, participando de nossas vidas. Ela...a aranha!!! Não queiram saber o horror que eu tenho de aranha!
É físico,  me arrepio toda, fico paralisada e gelada. Pensei rapidamente :-"o que é isso? uma aranha num apartamento? no quinto andar?".
Continuei pensando e olhando para ela que também (acreditem) olhava para mim, petrificada.
Como a poltrona havia estado na tapeçaria para uma pequena reforma eu logo pensei:- "é isso, aqueles tapeceiros distraidos não viram que havia uma aranha dentro e trouxeram essa coisa horrorosa até aqui"!
Ai Meu Deus! o que eu tinha que fazer?  O primeiro impulso foi sair correndo e chamar o síndico, no andar de baixo.
Mas meu alerta   "se manca Ivani" começou a piscar. Já era tarde, não poderia incomodar o pobre homem.
Ai, ...tudo isso passava pela minha cabeça em segundos enquanto eu não tirava os olhos da garota cheia de pernas, preta,  provavelmente  analisando todos os meus movimentos.
Pensei:- tenho que matá-la, essa situação é ridícula.
- Ivani...você é muito maior  que ela, pegue a vassoura e vapt!!! coragem mulher!
Fui bem devagar até a lavanderia, peguei a vassoura dura de esfregar chão, voltei disfarçadamente como se fosse apenas dar uma varridinha na sala ( para ela não desconfiar de nada ) enchi-me de muita  coragem  e taquei-lhe a vassoura com gosto.
Sentia-me tão mal que não tinha coragem de tirar a vassoura de cima dela. O que fiz? fui arrastando a nojenta  com toda a minha força até a porta do terraço, abri e - vapt!!! lá se foi ela com vassoura e tudo!
Fechei rapidamente a porta e coloquei um pano embaixo para que, caso a visita não tivesse morrido, não resolvesse voltar.
Fui dormir depois de tomar um tranquilizante porque meus nervos estavam esfacelados.
No dia seguinte vou devagar dar uma olhadinha no estrago. Pensei que a pobre estaria lá, rodeada de formigas, pernas para o alto.
Qual o que...ela estava em pé, ao lado da vassoura caída, implacável, olhando para mim, desafiadora. Peguei a vassoura com cuidado, bati mais algumas vezes porque afinal,  era ela ou eu!
Foi quando percebi que meus golpes não a atingiam porque era uma aranha de plástico, um brinquedo que meu neto esqueceu de recolher. Queria ter visto a minha cara nesse momento. Ria como uma maluca, mas não tive coragem de pega-la do chão. Meu instinto não permitiu..
Ficou ali até meu neto chegar e salvar sua coleguinha, dando boas gargalhadas da minha aventura noturna.  Um dia desses me deparei com ela na fruteira. Sinceramente não consigo travar um relacionamento amigável com essa senhora cheia de pernas. . .

E você, já pagou um mico desse tamanho?

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Um quintal


Vou chama-lo de Anjo. Nunca me perdoarei por esquecer o nome real.  Se no decorrer das lembranças uma luz brilhar nessa velha cabeça com seu nome de batismo, escreverei imediatamente.
Era dono do quintal mais cobiçado do bairro. Toda a frente do terreno era ocupada por uma horta, um pequeno pomar, uma plantação de ervas medicinais e um jardim. Sim, tudo isso no quintal!
A pequena casa onde vivia com a mulher ficava nos fundos, mal se via da rua. O terreno, com leve inclinação para o alto era cercado com madeira, finas tábuas enfileiradas, e um pequeno portão que ao abrir nos dava passagem para um caminho de terra sinuoso e fresco, até o pequeno terraço.
Nesse terraço um poço de água potável,  um tanque de lavar roupas e uma pequena mesa onde repousava um filtro de barro para deixar a água mais limpa e fria. Ele insistia para que tomássemos da água,  em caneca de alumínio, tão fresca...
Tinha uma filha apenas, enfermeira de um grande hospital em São Paulo, muito pouco a víamos.
Mas vamos nos ater ao quintal. Uma grande árvore, próxima ao portão, refrescava a casa e o quintal nos dias quentes.
As verduras da horta, couves, alfaces, escarolas, cheiro verde, almeirão, eram vendidas a preços mínimos para os vizinhos, apenas para custear  mais sementes. As flores...ah! as flores!
Eram dálias, lirios, rosas, cravos, que enfeitavam a beirada da cerca e que ele colhia com prazer para  decorar a mesa de um casamento, ou para que as crianças acompanhassem  um enterro cantando hinos e carregando os pequenos buquês nas mãos.
Os pés de limão, laranja, ameixa, amora... que todos tinham também em seus quintais,  floriam e davam frutos.   Para quem pedisse ele colhia de mãos cheias, pois perdiam-se os frutos entre as flores e verduras.
Mas o que mais tenho gravado na memória é o canteiro de ervas medicinais. Perdoem-me, nunca conseguiria lembrar-me de todas. Mas algumas sim:- erva-doce, camomila, boldo, hortelã, carqueja, losna, bálsamo, e tinha uma ervazinha danada de amarga, a marcelinha,  ótima para digestão difícil.
Eram tantas que ele cultivava e dava aos punhados para quem estivesse precisando de um chá ou um emplasto.
Mas o meu Anjo não era só isso. Ele aplicava injeções, acredito que treinado pela filha,  em pessoas que estavam acamadas e não podiam ir até a farmácia. E é nesse momento da narração que me emociono e tenho as lembranças mais vivas.
Quando minha mãe estava muito mal, quase nos deixando, suas dores eram extremas e apenas um tipo de injeção a deixava tranquila.
Nosso Anjo era então chamado às pressas e aplicava-lhe o grande alivio. Olhava em volta e dizia para mim, a mais velha das crianças:-  pode me chamar quando precisar, seja qual for a hora.
Nos ultimos dias papai me acordava aflito, não raro o Edison me acompanhava  pela  rua em altas horas da madrugada para voltarmos voando sobre as asas do Anjo.
Ele nunca reclamou e nem cobrou um centavo pelas aplicações.
Muitos anos se passaram, já nem morava mais naquela cidade, quando soube de sua morte.
Inúmeras vezes visitei o bairro e passei devagar em frente ao quintal.  Agradecia  baixinho todo o carinho e devoção. Hoje há uma casa grande sobre tudo o que houve por lá. Tudo mudou. Até o verdadeiro nome dele eu tive a ousadia de esquecer.
Mas nunca esquecerei seu rosto bom, sua caixinha de aço com as seringas, sua pressa em vir correndo comigo, pelas noites escuras, pelas ruas de terra.
Esse Anjo e esse quintal eu jamais esquecerei. Que seja abençoado seu descanso. Amém!
   

    

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Sinceramente . . .


Nesses dias que antecedem o feriadão me surpreendo pensando para onde gostaria de ir. O primeiro pensamento é Paraty.
Tenho alguma relação "sem noção" com aquela linda cidade. Lembro-me de ter chorado muito andando pelas ruas estreitas e olhando em minha volta, com a  emoção indescritível de reencontro.
Meu marido olhava para mim sem entender nada. Nem eu entendia, mas eu já havia estado lá, conhecia aquelas ruas e becos. Aconteceu comigo a mesma coisa quando estive pela primeira vez em São Sebastião, São Paulo.
Das outras vezes já não chorei, apenas ficava olhando, admirando, respirando fundo. Tudo que tem em Paraty me encanta e eu tenho vontade de ir correndo para lá...

                                                                            Serra Negra

Adoraria também ir até Serra Negra, aqui tão perto, ver suas vitrines de roupas de linha, confeccionadas lá mesmo, suas lojas de artigos de couro, sua praça onde sempre tem um seresteiro cantando.
Sentar sob uma árvore, apreciar um doce, um sorvete, depois voltar para casa.

                                                                          Iguape
Adoraria ir a Iguape, cidade histórica do vale do Ribeira, tombada pelo patrimonio histórico, bem ao lado de Ilha comprida.
A viagem é bonita, o vale do Ribeira é bem grande e  durante muitos quilômetros o viajante tem como companhia a exuberância da reserva florestal da Juréia. É uma maravilha, um espetáculo verde pontilhado de flores.
Sinceramente? são tantos os lugares que gostaria de ir, que se fosse enumera-los ficaria aqui escrevendo por muito tempo, e chateando vocês com tantas palavras.
Mas sabem o que vou fazer no feriado?
Ficar de plantão aguardando o pedreiro que vai arrumar o telhado de minha casa, antes que chova muito e a inquilina perca de vez a paciência comigo.
Vamos aproveitar esses dias para trabalhar. Eles trabalham e eu fico esperando os pedidos de:- dona Ivani compra mais cimento. Dona Ivani,  vou precisar de mais um pedaço de calha. Xiiiiii dona Ivani, tem muita telha quebrada, a senhora vai ter que comprar algumas, urgente em?
Deu para sentir?
Desejo a voces todos um feriado bem tranquilo, passeando ou não.
E então, contem para mim por onde gostariam de passear nesses dias...vou adorar saber.

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

O primeiro baile



Pense em uma garota sonhando com um baile. Pense no pai da garota não querendo deixar...
Isso lá nos anos 60, meus anos dourados, minha juventude tão distante.
Os amigos, os pais dos amigos, fizeram campanha, pediram, comprometeram-se, até que papai cedeu, e deixou!!!
Ah! o vestido! foi um parto separar o dinheiro do salário para comprar o vestido. Ele era rosa pálido, bordado à máquina com rosinhas mais escuras e brancas, modelo tubinho, comprimento na canela. Os sapatos de salto médio eram creme, meias de seda completavam o figurino. Cabelos presos, maquiagem pesada nos olhos (era moda gente!), bolsinha emprestada. E lá vou eu...
Os pais da Ideli foram em casa me buscar,  na Kombi do Sergio porque permitia levar mais pessoas.
Era o baile de aniversario de nossa fanfarra, que tinha sido "promovida" a Banda Marcial.  Para todos nós, integrantes da fanfarra e alunos do Colégio Ceneart, era motivo de muito orgulho e celebração.
Eu, metida como sempre, namorava o comandante da banda, e podia deixar de ir? Lembro-me das amigas, lindas e felizes:- Ideli, Soninha, Milena, Rose, Elirea, Lidia, tantas meu Deus, não me lembro dos nomes.
Os meninos também bonitos e bem vestidos: Fausto, Cassio, Rony, Ira, Claudio, o Branco  ...tenho todos os rostos aqui na cabeça, mas os nomes...
Uma noite linda, mágica.
Teve a maciez da seda, o perfume do caramelo, o brilho da água.
Quando a orquestra tocou a música de minha vida, La Mer, não ficou um casal sem dançar.
Meus olhos procuraram pelo salão, aflitos, pelo meu par, meu amigo e primeiro namorado.
Ficou na boca o sabor da cuba-libre, e nos ouvidos a melodia que até hoje me emociona.
Não vejo mais meus amigos, mudei-me de cidade, não me casei com o comandante.
Tive outros bailes, outras músicas outros olhos procurando pelos meus. Vale a pena recordar.
E você, tem algum momento mágico para contar? conte-me...