quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

VIVA!



Pessoas se abraçando sorrindo e desejando as melhores conquistas para o novo ano sempre me emocionam.
Desde muito cedo achei a festa de fim de ano mais emocionante que o Natal. Nem sei se consigo colocar aqui como penso, mas vou tentar. O Natal é lindo na sua essência, e é lindo também na pureza das crianças que aguardam o papai-noel com presentes tão sonhados. Mas também é comercio, compras e mais compras que nos enlouquecem, deixando-me com aquela sensação de que falta alguma coisa.
É muito dificil explicar - não é estar triste - é uma inquietação, um espaço vazio, acho que uma certeza brutal de que  eu mudei e nem percebi. Nem tente entender, porque nem eu consigo.
Mas o fim de ano, a promessa de dias novos, conquistas, desafios ... mexem comigo!
Se pensarmos que todo dia é novo, é sempre um recomeço a cada amanhecer, a virada de ano não teria graça alguma.
Mas um dia dedicado a prometer mudanças e a desejar em voz alta aos amigos e à familia querida tudo aquilo de bom que realmente - e sinceramente - sonhamos, é mesmo um dia muito especial.
E penso que se estamos tendo a chance de recomeçar... isso é bom, traz alegria! Então a emoção vem pelo que estamos deixando?... pelo ano que passou?
Dificil realmente explicar. Se estamos entrando em um ano novinho, e acabando de sair do ano velho, não podem ser lágrimas de saudade. Ainda nem deu tempo!
Portanto, escrevendo e pensando sobre isso só posso chegar à conclusão que: - é emocionante porque é uma despedida, e eu não gosto de dizer adeus.
Aquela musiquinha "adeus ano velho, feliz ano novo, que tudo se realize..." eu nunca consegui cantar até o fim, sem sentir um apêrto no peito e a voz sumindo entre lágrimas.
Mas isso não é novidade, desde tempos remotos, na juventude, sempre foi assim.
Mas dados os abraços gostosos, feitos os votos sinceros, levantados todos os brindes possíveis, tudo passa num instante e a festa é linda e alegre.


As pessoas todas deviam escrever sobre suas dificuldades. Isso ajuda a exorcisar, a colocar as bruxas para correr, gritando como loucas...
Para quem ler essa minha última postagem do ano, deixo aqui um pedacinho de mim, bastante emocionada.
Espero que continuem me visitando e lendo minhas bobagens, e me incentivando a continuar, porque adoro quando deixam recadinhos e comentarios gostosos.
Que tenham paz e saúde, amor e carinho, sonhos e realizações. Sintam-se abraçados por essa amiga sincera e fiel que precisa contar suas coisas porque senão nem ela se entende.
Um brinde a tudo o que passou, porque tinha que passar. E um brinde a tudo o que virá, porque tem que vir e nós temos que celebrar!
Tim-tim !!! VIVA!!!




segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

ando sem tempo!



Já que é Natal, e já que a gente pensa "muito" em comida nessa época, vamos falar de coisas gostosas e de como é prazeroso fazê-las?-
Longe de mim ser a Palmirinha, ensinando receitas para minhas espectadoras, nem tenho essa capacidade, e não quero ter...já me basta  o que faço todo dia na cozinha!
Mas Natal requer um pouco mais de sofisticação, de memória para lembrar de nossas avós e mães, e de uma boa dose de coragem para enfrentar um forno quente nessa época de calor intenso.
Acredito que somos - todas nós - umas saudosistas irrecuperáveis, precisando de internação em uma clínica de repouso, pelo fato de fazermos questão de cozinhar em uma época dessas.
Precisa muita coragem para fazer compras, limpar a casa de maneira especial, decorar com motivos natalinos, fazer supermercado com uma lista enorme nas mãos, cuidar das unhas, dos cabelos, comprar uma roupinha nova e mesmo assim achar lindo e romântico encarar o fogão na véspera de Natal - o dia todo!.
As crianças ficam infernais,  só perguntando quantos dias faltam para o Papai Noel chegar, e criam um ânimo tal para correr e falar ao mesmo tempo, que têm-se a impressão de estar em uma panela de pressão, gigante!
Somos todas loucas porque gostamos disso tudo, fazemos todo esse trabalho com um sorriso nos lábios e algumas latinhas de cerveja na cuca, porque ninguém é de ferro. E então ficamos inventando pratos que a memória teima em esquecer, calóricos e pesados - rabanadas, pernil assado, lombo, farofa! - Santo Deus, e de sobremesa bolo com chantili, bastante creme, frutas secas, nozes, castanhas, ufa!  acho que vou abrir mais uma cervejinha bem gelada!
E pensar que tudo isso passa tão depressa, que no dia seguinte restam apenas mais algumas varizes nas pernas e um esgotamento físico brutal - mas uma alegria enorme com aquela sensação de dever cumprido! -
e uma vontade de dormir por dias e dias....
Natal é tudo isso e um detalhe a mais, que eu jamais esqueceria. É uma alegria sem fim, inexplicável, ao ver a familia reunida e as crianças felizes com seus presentes. E é também um momento de meditação e agradecimento por tudo o que temos e podemos dividir com quem amamos.
Saudade dos que já não estão entre nós e comunhão com os que estão aqui e são a razão de toda essa loucura gostosa.
Preciso terminar minha lista de supermercado...acho que esqueci das azeitonas para a farofa...


terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Natal na roça



Esse mês de dezembro é mesmo complicado. São tantos compromissos, e  presentinhos das crianças sempre comprados em cima da hora, e festinhas de natal antecipadas, que quando me dou conta já se passaram vários dias desde a última conversa aqui em meu querido blog. E nesse mês de dezembro tão quente e cansativo me comprometi a lembrar de natais que marcaram minha vida.
Sei que já falei sobre meu querido sitio em Ibiuna,  onde vivi um período doce, cheio de alegrias. Todos os natais, enquanto o sitio foi nosso, foram festejados lá. Uma semana antes e já estávamos com tudo arrumado, empacotado, cardápio decidido,  prontos para as festas de fim de ano na roça! Coincidiam as férias do Luiz  com as festas, e ficávamos por lá até meados de janeiro, totalizando um mês. São os  anos que mais me trazem saudade.
Meus filhos esperavam impacientes pelo  papai-noel,  faziam cartinhas, deixavam bilhetes por todo canto, temerosos de que Noel não se lembrasse dos pedidos. Quando chegava a noite meu marido e eu fazíamos uma parafernália de barulhos e luzes anunciando a chegada do velhinho, enquanto os pequenos ficavam com a vovó, rezando no quarto, e ligadíssimos nos sons lá de fora.
Até que finalmente os presentes já se amontoavam embaixo da árvore e a barulheira infernal do papai-noel indo embora apressado (pois tinha muito serviço naquela noite!) tocando seu sininho ia ficando mais longe, até sumir na porteira. Os pequenos então eram liberados das orações e corriam para a sala, com os rostinhos corados e as mãos estendidas sem saber o que pegar primeiro.
Por mais  que eu viva nunca vou esquecer aquelas noites, nem os olhos de meus filhos procurando algum sinal do velhinho que foi embora tão depressa - por que não ficou mais? - e rasgando os papéis, e abrindo caixas e gritando de surpresa!
Depois que os ânimos se acalmavam  íamos comer nosso jantar, preparado durante o dia  - em meu fogão a lenha - com a ajuda de minha sogra que, invariavelmente,  fazia "crústolis" para as crianças e bacalhau para o maridão português.
Eu procurava agradar as crianças fazendo arroz com uva passa, rabanadas, sempre um bolo enfeitado e - é claro - um tender com frutas para o maridão, que gostava muito.
Posso dizer que era maravilhoso...naquele sitio solitário,  minhas crianças,  meu marido, e meus sogros, não tínhamos medo de nada, não desejávamos mais nada.
Hoje eu sei que a felicidade está nas coisas simples, na alegria de ver os filhos sorrindo, no aconchego do abraço da pessoa amada e companheira, na certeza de que o mundo lá fora é bom com você, na mesma  proporção que você não exige muito dele.
Gostávamos - eu e meu marido - de sair para o quintal, completamente às escuras, e olhar as estrelas de nosso céu. Era tão salpicado de brilho que até parecia uma chuva de luz. Naquela época não sabia o que era saudade, apenas sabia que estava fazendo o que acreditava certo, o que meu coração determinava.
Ficávamos sentados em nossa varanda, luzes apagadas, ouvindo o som que vinha da sala, as crianças rindo, falando com os avós e tínhamos um ao outro, já era o bastante.
Fecho os olhos e sinto o cheiro de nossa ceia, o sabor de uma rabanada, o calor do abraço de meu marido, a alegria totalmente inocente das crianças.
Geralmente no dia seguinte chegavam alguns familiares para o almôço, trazendo coisas gostosas para juntarem com as nossas e passavamos um dia inteiro falando e comendo e rindo muito...
Sobre o papai-noel o que vou dizer é que numa dessas noites de natal, enquanto o Luiz se matava para fazer luzes piscarem, barulhos de trenó, risadas gordas de bom velhinho,  eu e meu sogro - como sempre -  corríamos até o carro dele para tirar os pacotes que ficavam lá guardados. Então... dois xeretas curiosos espiaram pela janela e descobriram - o que já desconfiavam - que era tudo encenação.
Sem traumas nem muitas complicações combinamos com os dois satisfeitos "sabidões" que a brincadeira ia continuar até a caçula também perceber, e que eles iam fingir que acreditavam pra não estragar a magia.
Tudo isso durou ainda muitos anos e chego a pensar que nunca acabou completamente.
Sou uma pessoa feliz,  a vida me presenteou com mais crianças maravilhosas, adoráveis, as quais procuramos envolver na magia do Natal, com luzes, sons, sinos, presentes...
Cada um dos meus filhos tem sua familia, e cada um deles procura fazer suas crianças felizes nessa noite linda. Eu acredito que lá no fundinho de seus corações eles se lembram do amor e da infinita alegria de seus natais de criança. Que essa pequena chama de lembrança nunca se apague...
Vou brindar à alegria, às luzes, às estrelas nas noites de Natal ...que sejam eternas! tim-tim!

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

O chorão!

Como "sabiamente" deixei gravado na minha ultima postagem  : - não vou mais falar de Natal triste - pretendo seguir à risca minhas determinações. Lembranças não pedem passagem, não batem à porta e geralmente têm más intenções. Não há o que corrigir porque não posso voltar no tempo, então, meu grande consolo é falar sobre elas.
Tivemos festas lindas no decorrer dessa minha vida louca. Em algum momento do passado devo ter feito um acôrdo comigo mesma:  - vamos lá garota! vamos ser felizes porque tristeza produz rugas no rosto! - não que isso tenha me livrado delas (as rugas). Mas como dizem os poetas "cada ruga tem uma historia", e as minhas são aquelas que marcam ao redor da boca e dos olhos, de tanto rir.
Tenho vocação para a felicidade, já escrevi isso por aqui, portanto as lembranças amargas me fazem chorar, mas não o tempo todo. Sorrir e falar sobre coisas engraçadas é um de meus passatempos favoritos.
E houve um Natal que foi engraçado, para mim nem tanto, e vou explicar porque. A emprêsa onde papai trabalhou por quase uma vida toda, uma grande fundição, tinha um clube com campo de futebol e enormes eucaliptos em sua volta. Era um lugar lindo, e eu digo era porque hoje é um grande pátio de fábrica. Nesse campo com  grama era realizada, ano após ano, a festa de Natal dos funcionários e suas familias.  Ficávamos o domingo todo por lá, comendo pipoca, algodão doce, lanches salgados e ainda ganhávamos uns sacos de papel cheios de doces coloridos, sorvetes, guraná na garrafinha, ufa! uma delicia.
O papai-noel aparecia de charrete, toda enfeitada e com a banda tocando músicas típicas à frente. Era mágico, lindo! A uma certa altura começavam as ditribuições dos brinquedos, e nós, em fila, esperávamos tão impacientes pelos nossos presentes, que parecia um castigo a fila demorar tanto para andar!
Quando finalmente aquele pacote de papel celofane com laço chegava às nossas mãos - por Deus! - o coração explodia de alegria.
Nesse determinado ano, acredito que 1955, meu pacote trazia um palhacinho de pano, com cabeça de borracha e chapéu de cone. O corpo do boneco já era seu macacão, de bolinhas, e o rosto era pintado com a maquiagem pesada dos palhaços de circo. Não media mais do que trinta centímetros, acredito, e era encantador. Mas, minha alegria durou pouco. Meu irmão Edison, então com apenas quatro anos, sismou que queria o meu brinquedo. Sinceramente não me lembro o que ele ganhou, quem sabe poderá me ajudar a lembrar? Os gêmeos eram bebês e provavelmente ganharam algum brinquedinho de borracha com assobio.
Só consigo me lembrar daquele moleque, chato, chorando aos berros, querendo meu palhaço. Era uma coisa tão insuportável aquela gritaria que mamãe determinou que trocássemos de brinquedo, ele ficando com o meu.
Eu queria entender porque um menino tinha que brincar com boneco, abraçado, andando pelo campo de futebol como se fosse o pai do palhaço....
Meus pais repetiram varias vezes que logo ele me devolveria o presente, que eu tivesse paciência. Ele nunca me devolveu totalmente. Deixava que eu pegasse às vezes, mas até dormia com o palhacinho com medo de que eu o roubasse.
Aquele pequeno ditador...
Isso tudo já rendeu muitas gargalhadas em nossa familia. Os homens brincavam com meu irmão, duvidando de sua masculinidade e sugerindo bonecas de presente, por anos a fio...
Ele por sua vez nunca deu muita importância às provocações, ignorando a todos e namorando todas as meninas que passavam por seu caminho.
O palhaço perdeu-se no tempo, ficou jogado em algum canto quando rasgou a roupa e descolou o chapéu de cone da cabeça pintada.  Eu o desejei muito apenas naquele dia de festa, para passear orgulhosa, abraçada a ele, exibindo, como fez meu irmão xereta e manhoso com sua capacidade imensa de gritar e exigir.
Obviamente não ficou qualquer mágoa, nem poderia pois tudo aconteçeu entre crianças, como deveria ser também entre adultos, tão sábios e experientes, mas com uma capacidade incrível para guardar rancores.
Foi um bom Natal, assim como foram muitos outros que comentarei depois.  Alguma lição a tirar disso?
Agora sim,  passados tantos anos e convivendo com uma quantidade razoável de filhos e netos e sobrinhos,  aprendi que o que vale no Natal é a magia, o clima de festa, o suspense pelo presente, abrir o pacote...o coração aos tropeções.
Notem que as recordações são muito mais nítidas com relação ao ambiente, e nem me lembro o que foi feito do palhaço...
Um brinde às lembranças, aos sonhos de criança, ao papai-noel na charrete tocando o sininho, ao cheiro de grama pisada enchendo o ar.  Tim...tim!


quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Continuando...



Vou continuar revirando minha caixa de Natal. Hoje li uma mensagem muito bonita, feita pelo marido de uma comissária da Gol, que estava naquele vôo fatídico de alguns anos atrás. Ele fala sobre como teria se comportado se soubesse que aquele seria o último dia que a teria junto. É um relato emocionante, dramático mesmo, feito por um homem destruido, um dia após a queda do avião.
Não é fácil você perder uma pessoa querida de maneira tão rápida e brutal. A sensação de abandono de quem fica é devastadora,  a dor é física, na carne. Após ler a mensagem fiquei meditando sobre a possibilidade de alguém saber ou não se vai perder alguém querido, e quando.
Então lembrei-me do último Natal com minha mãe. Era fim de ano e eu ia fazer dez anos em março. Ela já estava muito doente. Sei que ela pediu ao meu pai que comprasse roupinhas novas para nós quatro, eu e meus três irmãos menores, porque tínhamos que ir à missa de Natal de roupa nova. Isso era tradição lá em casa, e ela estando tão mal, e sabendo das dificuldades financeiras de meu pai, mesmo assim insistiu naquilo.
Nos anos anteriores era ela que sentava-se à máquina de costura e preparava roupinhas para todos - inclusive para o bonecão - mas aquele ano não seria possivel.
E lá fomos nós, papai eu e meus irmãos, de ônibus, com uma recomendação de mamãe para que meu vestido fosse modelo "charleston". Nem sei explicar aqui o que significa essa moda. Quem é daquele tempo vai se lembrar. Era uma febre esse tal modelo e ela tinha visto na televisão, provavelmente.
Enquanto escolhíamos as roupinhas, a gerente da loja perguntou ao meu pai onde estava a mãe das crianças, e eu o ouvi  respondendo que ela estava muito doente. Meu pai estava atrás de umas araras de roupa e não percebeu que eu ouvia quando disse: - ela talvez não tenha mais um mês de vida.
Lembro-me perfeitamente de minha reação de espanto, acho que de susto. Minha mãe? então ela não vai sarar? ela vive dizendo que vai ficar boa para cuidar de nós, e ela não sabe de nada?
Mamãe faleceu no primeiro dia de fevereiro.  A previsão de meu pai foi mesmo certa, ela descansou de uma longa  doença.
Então hoje me pergunto: poderia ter feito alguma coisa diferente para minha mãe, sendo que sabia que ia perde-la?
Confesso que fiquei muda, ela nunca percebeu, nem meu pai, nem meus irmãos, que meu coração de criança estava tentanto assimilar aquilo tudo.
Não fiz drama,  era muito menina, não tinha noção do que iria sofrer com a falta dela. Tentava apenas entender porque nossa vida era assim.
Mas voltemos ao Natal, o vestido ficou lindo! Fundo branco e listinhas vermelhas, cintura baixa, pregas na saia, laço vermelho marcando a costura do quadril. Meus irmãos com suas calças e camisas novas,  fomos à missa como ela gostava, nem me lembro muito bem desse detalhe, mas lembro-me de todos enfileirados ao lado de sua cama para que ela nos visse tão bonitos!
E ela sorria e dizia - se comportem na igreja, senão eu fico sabendo em? ...
Não escreverei mais sobre Natal triste, prometo. As próximas postagens serão alegres e divertidas.
Confesso que chorei ao escrever hoje, porque há tempos não tinha imagens tão fortes daquela época.
Aquelas quatro crianças arrumadinhas com suas roupas novas fazem parte de minhas recordações mais dolorosas.
Continuaremos revirando a caixinha de Natal, mas chega de tristeza. Agora é só saudade, mas saudade da boa, daquela que faz florescer um sorriso nos lábios enquanto escrevo. Aquela saudade que transporta no tempo, aquece a alma, tranquiliza o coração. É dessa que eu gosto...até lá.


terça-feira, 30 de novembro de 2010

a caixa de enfeites

Fazem poucos minutos que abri meu armário e tirei a caixa com os enfeites de Natal. São tão poucos, uma caixa pequena, onde estão todos acomodados desde o começo deste ano. Antes eu tinha mais, a caixa era grande, algumas sacolas de papel ajudavam com as coisas mais leves. Fui perdendo pelo caminho, pelos anos afora.
Quando meus filhos eram pequenos a árvore era grande, com muitas bolas e festões, lâmpadas coloridas piscando, estrelas, laços, anjos.
Fazem uns anos que deixei de montar a árvore,  montei o presépio na capela do bairro onde morava e deixei por lá. Guardei apenas o papai-noel lindo e vermelho e alguns enfeites de parede.
Fazem poucos minutos também que ao abrir o armário e pegar a caixa de enfeites, abri a porta das lembranças e me vi menina pedindo um boneco grande para minha mãe.
Naquele mês de dezembro eu a observava fazendo um vestido vermelho para mim, de salpicos brancos, com um laço grande para amarrar na cintura e babados na barra. Com o pedaço de tecido que sobrou minha mãe costurou uma roupinha bem menor, parecia um macacão de bebê. Quando eu perguntei para quem era aquilo ela respondeu rindo - é para seu irmãozinho que vai nascer! - o que me deixava muito confusa porque os gêmeos eram tão pequenos - será que mamãe teria mais um bebê? Ela estava brincando, claro, mas eu não entendia, acreditava. Quando ela começou a fazer sapatinhos em crochê, combinando com uma touca de pom pom, em lã vermelha, eu achei mesmo que era um enxoval de criança. Mas na inocência dos meus sete anos nem me preocupava.
Na noite de Natal, estávamos na cozinha vendo mamãe e minha avó preparando os temperos para as carnes que seriam assadas no dia seguinte, porque naquela época a familia se reunia em nossa casa para um grande almôço. Em uma certa hora minha mãe disse para mim - vá até o quarto pegar um lenço para seu pai - e lá fui eu correndo, acendi a luz e dei de cara com meu boneco sentado em cima do criado mudo, vestido de macacão de salpico, touca de pom-pom e sapatinhos de crochê.
Aquela sensação de surpresa misturada com alegria me fez pegar o boneco e sair correndo como louca, orgulhosa de meu presente e de ter um bebê com a roupa de tecido igual ao meu vestido que eu só vestiria no dia seguinte para ir à missa.
Era um boneco de papelão, muito comum naquela época, uma solução para pais que não podiam comprar bonecas caras,  importadas. Eles eram enormes, com pernas grossas, cabeção com pintura imitando cabelos marrons, olhos azuis - também pintados - e rosto corado, bem cor-de-rosa.
Hoje quando me lembro dele sei que era feio, um tanto grosseiro, brilhante demais. Mas como era bonito para mim naquele dia! Nunca houve um boneco tão lindo em toda a face da terra. Foi um Natal feliz, não me lembro de mais nada daquele dia, nem do outro quando vesti meu vestidinho novo e provavelmente fui à missa, como era hábito. Só me lembro dele com seus imensos olhos azuis que nunca piscavam nem dormiam mas que eram maravilhosos.
É tão fácil agradar uma criança, mesmo as de hoje - basta faze-las esperar pelo presente, sonhar com ele.
E que o momento da entrega seja mágico, único, para que fique gravado na memória como tatuagem, inesquecível.
Aquele boneco ficou no quintal numa noite que eu não me lembro se estava cansada de brincar, se precisei entrar correndo para atender minha mãe ou se foi uma grande falta de cuidado de minha parte.
E naquela noite choveu muito, uma chuva capaz de derreter o papelão e estragar irremediavelmente meu bebê. Nem preciso contar aqui as lágrimas que chorei e a bronca que levei de minha mãe.
Tive outras bonecas, duas ou três, mas nenhuma delas tinha o encantamento do meu bonecão desengonçado e feioso. Quando fecho os olhos e puxo pela memoria consigo ve-lo olhando para mim com seus grandes olhos azuis e o  cabelo esquisito pintado na cabeça enorme.
Tenho várias lembranças de Natal da minha infância e da infância de meus filhos Vou aproveitar a época do ano para contá-las, revivê-las. Vai ser muito bom, abrir o armário, revirar as sacolas e caixas, arejar as recordações e saudades, para quando as festas acabarem tornar a guardá-las com carinho, envoltas em papel de seda, bem no fundinho do coração.
Faz parte da vida lembrar do passado. Alguns gostam de contar, outros apenas lembram e se calam.
Qualquer que seja a opção o importante é ter do que sentir saudade, sempre...

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Larissa




No dia em que ela nasceu chovia muito e o horário não podia ser mais revelador, meio dia!
Hora da boia! um de seus programas favoritos é sempre sentar-se à mesa e comer um bom prato.
Os antigos diziam que quem nasce em dia de chuva é muito chorão. Bingo de novo! adora chorar.
Foi nosso primeiro bebê, mas não minha primeira gravidez. Minha primeira filhinha já nasceu sem vida, prematura, e resolvemos chamá-la Renata, pois queríamos guardar o nome Larissa para nossa próxima menina.
E depois de um parto natural, com todas as dores que vêm no "pacote", ela veio ao mundo chorando muito, como que dizendo "acabou o sossego moçada!".
Nem tanto... era uma criança tranquila, dorminhoca, serena. Uma nenê com a pele morena, pouquíssimos cabelos, linda.
Como a primeira netinha, de ambas as familias, dá para imaginar a festa! Foi muito celebrada,  mimada ao extremo. Acho que celebramos demais, porque essa garota cresceu achando que era uma super "star", tinha que ser cortejada o tempo todo, atendida em todos seus caprichos.
Apesar de amorosa com os irmãos, sempre dizia que estava sobrando na casa, que todos davam mais atenção ao irmãozinho chorão e depois à irmãzinha chata e caçula.
Tudo tão normal em se tratando de familia que hoje nos recordamos disso tudo com muita saudade e boas risadas.
Larissa foi adolescente paqueradíssima, uma garota linda, todos os meninos da escola queriam namorá-la. Minha sogra era apaixonada por ela, vivia jurando que não fazia diferença entre os netos - mas fazia -  não disfarçava a quedinha pela neta mais velha.
O pai nunca permitiu que se notasse qualquer carinho maior por ela, apenas, creio eu, encantava-se ao perceber o quanto eram parecidos fisicamente, e a facilidade com que ela soltava (e solta) um palavrão, em qualquer frase, comportamento bem típico dele!
Pois então... aí está nossa menina, mãe da Valentina,  filha carinhosa, irmã querida e super tia da garotada.
A querida "Tita" dos sobrinhos.
Hoje ela faz anos e jamais deixaria de homenageá-la em meu blog. Não somente porque sinto que devo deixar gravado aqui meu carinho, mas porque se não faço isso (depois de fazer para vários) poderia considerar-me uma mãe excluida, sem a mínima chance de perdão.
Brincadeiras à parte, minha filha, você sempre foi muito amada, e hoje sinto muito orgulho de você.
Uma mulher que está sabendo conquistar seu espaço no mundo, trabalhando e nos mostrando para que veio.
Como sei que você pouco bebe, mas quando bebe adora cerveja preta, vou fazer meu brinde de hoje com uma bela taça, bem gelada, dessa delicia que você tem razão de gostar.
Seja muito feliz, conquiste muitos amigos nessa nova jornada, seja mãe extremosa e mulher corajosa.
Tenha MUITA saúde e não esqueça que te amamos Tim...tim!
Uma foto para matar saudade....que lindos!

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

"inhá" Albina


Esse título de "inhá" ela carregou durante toda a vida. Era uma maneira carinhosa de tratar as mocinhas naqueles idos de 1900, quando minha avó ainda era menina. Explico que não pronunciavam o "S" de sinhá para facilitar, ou por preguiça mesmo.  Mas vamos pronunciar certo, de verdade mesmo -  é "nharbina" - como se fala lá pelos lados de Capivari, Piracicaba e também Sorocaba. E assim foi conhecida, sempre.
Nharbina foi mãe de meu pai, uma figura rara entre as raras. De bela estampa, alta, magra, cabelos sempre com "permanente" para ficarem armados, vaidosa ao extremo. Certa vez quase ficou careca porque disseram para ela que agua oxigenada clareava os cabelos, mas não explicaram qual o tipo ou grau da água,  causando um dano enorme, e o cabelo que restou ficou amarelo como ouro, todo espigado, duro mesmo. Demorou para crescer novamente e ela ria até não poder mais com a tal historia do cabelo de milho.
Fumava muito, cigarros sem filtro, fedidos e que amarelavam os dedos,  porque ela os aproveitava até o fim.
Tudo em volta cheirava cigarro, e todos toleravam esse vício que ela trazia desde menina, porque na velhice já não poderiam tirar-lhe essa alegria.
Quando estava enfrentando os sintomas de sua menopausa, aos quarenta e poucos anos, teve a infelicidade de passar pela pior das dores, seu filho Elidio, caçula dos homens,  morreu de maneira um tanto obscura. Vou pular essa parte, qualquer dia volto ao assunto.
Nharbina entrou em depressão, os hormonios alterados, as dores grandes demais para serem encaradas de frente. Preferiu se enrolar em seu caracol, silenciou, não queria mais brincar de mãe, de avó...
Eu, nessa época muitocriança,  lembro-me bem dos comentários das tias e de meu pai, lamentando que talvez estivesse louca, talvez um hospital para tratamento. Isso também dará outro capitulo, que eu prefiro contar à parte.
Ela não estava louca, apenas depressiva e muito doente, numa época em que não davam muita importância para esses problemas de mulher. Quando voltou do sanatório minhas tias levaram-na e a um centro espírita muito respeitado em Sorocaba, pois ela insistia em dizer que via um homem chorando em um canto do quarto.
Ela chamava esse homem de "sofredor" e as seções de mesa branca, de bençãos e passes, aliviavam aquela cabeça sofrida de mãe sensível e amorosa.
Com o tempo e o apoio constante dos amigos do centro e da familia,  recuperou as gargalhadas quando achava graça de nossas palhaçadas, agora os netos todos já crescidos, alguns já adultos.
Fumou a vida toda e lembro-me dela tirando do bolso da saia um lenço amarrado com vários nós, que ela desfazia com os dedos amarelos de tabaco e tirava dinheiro para um dos meninos ir ao bar comprar cigarros.
- pode comprar doce com o troco, traga bala de hortelã!
Um traço marcante seu era o hábito de fazer perguntas indiscretas aos netos, que respondiam de maneira mais indiscreta ainda esperando que ela ficasse corada, mas qual! encarava com muito jogo de cintura qualquer brincadeira da moçada.
Se a música no radio era alegre, puchava um neto ou uma neta e saia dançando, o que nos fazia felizes.
Por morar longe de sua casa eu pouco convivi com essa "sinhá" divertida, apenas nos períodos de férias, ou quando meu pai ia buscá-la para passar uns dias conosco.
Achava muita graça, uma delicia mesmo, quando ela dizia no meio de uma conversa: - coitado do Tide, olha como tá magro, esse meu filho não tem saúde!
Tide é meu pai, sempre foi magro, e todas as vezes que nos víamos era sempre a mesma observação. Virou até folclore na familia o "coitado do Tide".
Minha madrasta, Joana, ficava muito brava e dizia - até pareçe que a gente não dá comida pra ele,  sempre foi magro!". E todos nos divertíamos muito, até minha avó que teimava em explicar que Tide era mais gordinho quando solteiro - era nada!
Não me lembro, por mais que tente, de um prato ou guloseima que tenha feito em sua cozinha. Acho que não era dada à culinária, fazia o trivial. Também não se prestava a trabalhos manuais (pronto, descobri de quem herdei a dificuldade nos trabalhos artísticos) apenas costurando algumas roupas para ela mesma.
Quantas lembranças! ficaria aqui por horas escrevendo sobre aquela mulher divertida em sua inocência de pessoa humilde, desprovida de cultura, acho até que nem sabia ler, mas com olhos brilhantes e alegres de "sinhá" bonita e vaidosa, que namorou e casou com Plácido, meu avô,  na fazenda Samambaia, dando frutos queridos dos quais ela tinha muito orgulho.
Essa foi minha avó, uma das culpadas de tudo o que somos hoje - meio loucos, meio paranoicos - mas com essa alegria nos olhos, esse gostar de dançar, essa alegria de estar junto.
Para Nharbina eu levanto meu brinde de hoje e celebro a mágica de viver em meio a nuvens de fumaça, música no radio, lágrimas e sorrisos. Essa foi sua vida durante anos e anos e, para mim, foi o que ficou. Tim...tim!

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Menina moça




Talvez ela tivesse entre doze ou treze anos, magra, cabelo indefinido, querendo ser crespo, querendo ser liso.
Alta em relação às meninas de sua idade, sorriso tímido querendo ocultar os dentes que ela achava tortos, mas que não eram.
Sardas no rosto, poucas, mas que ela achava muitas quando se olhava no espelho. A mãe tinha contribuido, anos atrás, com essa paranóia de que sardas devem ser clareadas. Quando lavava o arroz, colhia a água e fazia a menina lavar o rosto com ela. Não podia enxugar! Com isso, fez com que ela acreditasse que as sardas eram feias, escuras. Mas não eram, eram adoráveis, simpáticas. Só que ela não sabia.
Quando começou a conversar com as amiguinhas sobre a chegada da primeira menstruação deixou-se tomar pelo pânico.  Essa garota nunca soube, ninguém contou a ela o que acontecia com as mulherzinhas daquela idade. Então teria também que menstruar? Ficou completamente sem rumo, resolveu que perguntaria ao pai. E perguntou.
Quando a vi chegando, sorrateira, querendo me confidenciar sobre esse dia, fiquei com pena ao pensar  naquele pai, chegando do trabalho e percebendo - porque ele percebia -que a filha estava com o rosto tenso, sem saber como começar o assunto.
- pai, minhas amigas já ficaram mocinhas, só eu ainda não.
Ela me conta, quando estamos conversando sobre aqueles dias, que sentiu muita vergonha. Nem sabe como conseguiu começar a falar.
O pai, como sempre, mostrou a maior naturalidade, explicou que algumas meninas demoravam mais, e que "era assim mesmo". Deu mais algumas explicações e sugeriu esperar o tempo se encarregar disso.
Mas o tempo não se encarregou e então aconteceu um fato novo, que quando ela me conta, rindo, eu só posso rir também. As preocupações se inverteram. O pai perguntava a ela se não tinha novidades e ela se envergonhava em dizer que não. Seria normal? Não seria melhor procurar um médico?
Lá se foram, pai e filha ao consultório de um médico de confiança. Nos nossos momentos de aconchego e confissões ela me conta que sentiu muita vergonha quando o doutor começou a fazer perguntas, dar explicações,  falou até sobre sexo!
Pobre menina, criança ainda e tendo que aprender através de  um estranho o que seria natural ser explicado e resolvido por uma mãe.


São muitas as noites que conversamos até tarde, rimos ou choramos, depende de nosso astral, depende da quantidade de cerveja que tomamos.
Ela me garante que superou esses pequenos traumas, que vive bem com essas lembranças, ora boas...ora divertidas...não raro tristes. Falou-me sobre quando suas filhas "ficaram mocinhas", do modo como foi  emocionante para ela, porque pôde participar, ensinar...
Quanto à sua primeira menstruação contou ao pai, envergonhadíssima, olhos baixos, como se fosse algo feio de dizer. O pai sorriu, perguntou se precisava de alguma coisa e lembrou-lhe o que o médico havia dito.
Muitos anos se passaram até que voltassem ao assunto. Quando  já estava casada e com as filhas adolescentes o pai um dia perguntou: - já disse para as meninas o que elas precisam saber sobre os assuntos de mulher?
Diante da resposta afirmativa ele apenas sorriu e olhou para ela com aquele olhar cúmplice que só ele tinha.
Quando vejo minha amiga lembrando-se desses momentos, pergunto se quem teve um pai tão presente, precisaria mesmo de uma mãe. Ela me responde sorrindo que sim, que sentiu a falta da mulher forte ao seu lado em alguns momentos cruciais, como nos partos. Mas que sobreviveu, não estava alí?
Sim, ela está aqui comigo. Às vezes menina, às vezes já velha, mas está aqui me olhando com olhos curiosos, à espreita, esperando que eu me dirija ao computador para contar mais um pouco de nossa história.
Quem diria amiga, que um dia seríamos companheiras de blog, e escreveríamos a quatro mãos nossa historia de vida.
Como conheço essa mulher que tem a mania de ficar menina quando me procura, sei também que ela jamais terminaria uma conversa sem levantar um brinde, porque adora celebrar a vida.
Aqui fica então nosso brinde de hoje, feliz e sem traumas, apenas repleto de boas recordações e saudades.
Saúde! tim...tim!

terça-feira, 9 de novembro de 2010

obrigada!



Seu nome é Norma. Em uma conversa com minha filha, dia desses, citei seu nome e fiquei com uma saudade gostosa remoendo minha cabeça, pensando em  falar alguma coisa sobre minha amiga.
Quando eu tinha 14 anos, quase 15,  conheci a Norma, ela então com 30 anos. Meu pai, através de amigos de trabalho havia conseguido me colocar em uma grande emprêsa de Osasco, como auxiliar de secretária.
A secretária do Departamento era ela, e eu fazia os serviços rotineiros de datilografia, arquivo, cópias....
De principio achei que a diferença de idade e a situação dela na emprêsa, jamais permitiria que fôssemos amigas. Na verdade, fiquei apavorada, porque eu era uma adolescente sem experiência alguma, nem de vida e muito menos profissional.
Já a Norma era uma mulher madura, ao menos eu a via assim, e seu comportamento deixava transparecer que eu estava certa. Comedida nas palavras, vestia-se sempre com elegância, saias justas, saltos altos, cabelo curto e bem penteado. Hoje, quando vejo Marilia Gabriela na tv, lembro-me dela, têm o mesmo tipo, menos a voz.
Meus temores logo foram embora. Fui acolhida como um mascote do departamento. Todos eram gentis e carinhosos, mas ela foi além, foi amiga, quase mãe. Como leitora fanática resolveu que devia me apresentar à literatura, devagar, emprestando-me livros (sem que eu pedisse) de José de Alencar, depois Casemiro de Abreu, depois Graciliano Ramos, e quando eu menos esperava, vieram os autores internacinais como Cronin, Pearl Book, Hemingway, Charles Dickens, e por aí afora.
Mas tudo era muito sutil,  numa conversa qualquer ela perguntava:-já leu fulano? quando a resposta era negativa, lá vinha ela com um livro para me emprestar.
E durante meu período de leitura, ela perguntava sempre - casualmente - em que parte do livro você esta?
Diante de minha resposta  fazia perguntas e comentários para que eu entendesse melhor o livro. Pouco tempo depois eu já estava apaixonada pela leitura, a ponto de não conseguir ficar sem um livro nas mãos.
Lembro-me dela falando ao telefone, sempre rodando um brinco na orelha, cadeira afastada da mesa, voz baixa e conciliadora. Solteira convicta, duas faculdades, vários namorados mas nenhum tão interessante a ponto de leva-la ao altar. Suas férias, invariavelmente, eram passadas em Parati. Eram tantas fotos, tantas historias engraçadas e divertidas, a ponto de passar para mim o carinho que ate´hoje tenho por aquela cidade linda. Só fui conhecer Parati depois de muitos anos, com minha familia, e entendi porque ela gostava tanto dali.
Alguns anos depois, talvez uns cinco,  ela foi convidada a trabalhar em um famoso laboratório alemão, lingua que  dominava, assim como o inglês, e foi um convite irrecusável. Lá se foi minha amiga, deixando-nos - a todos do departamento - meio órfãos e muito tristes.

Nossa amizade nunca saiu das paredes da emprêsa. Nunca fomos a uma festa, jantar ou cinema. Nossas vidas eram totalmente diferentes, os amigos e amigas dela eram pessoas mais velhas e bem mais interessantes que meus amigos. 
Perdemos o contato alguns anos depois, quando me casei e fui cuidar de minha familia. Até o último cartão que me mandou ainda estava solteira, feliz, fazendo tricô  - fazia blusas lindas de lã - para presentear o atual namorado.


Lembro-me dela rindo e dizendo: - eles ficam comigo até a blusa ficar pronta. Depois somem...
E eu dizia :- você é boba, já que sabe disso porque não tricota e desmancha...tricota e desmancha...
Oxalá toda menina sem mãe tivesse uma amiga como eu tive. Gostaria de encontra-la hoje para dizer tudo isso pessoalmente. Qualquer hora tento achá-la no Google, quem sabe?  lembrará de mim? estará bem?
Sei que parte da pessoa que sou hoje, devo a ela, e essa é a mágica.  Ela nunca me disse "vou ensinar uma coisa para você". Ela ensinava sem que eu percebesse, sem me chatear, me respeitando.
É claro que hoje meu brinde com cerveja geladíssima será para ela.
Obrigada querida por ter suportado minhas chatices de adolescente, meus papos furados sobre rock, Elvis, Beatles, paqueras, briguei com o namorado... voltei com o namorado...
Quem sabe um dia ainda nos veremos e vamos rir muito daquele tempo delicioso, quando aprendi o valor de uma amizade sincera e desinteressada, pois de mim você pouco esperava, nem mesmo  esse agradecimento tardio. Saudade...

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Plante!










Acredito que todos os internautas já conhecem o Nick, um rapaz de vinte e cinco anos que nasceu sem os membros - pernas e braços -  e dá um show de carisma e alegria.
Recebi hoje da Soninha, minha amiga querida, uma mensagem com fotos do Nick, um rapaz bonito, com olhos claros, brilhantes; sorriso contagiante, perfeito. Já tinha visto em vídeo e lembro-me de ter ficado com pena daquele homem bonito e terrivelmente deficiente.
Hoje, vendo as fotos, não senti pena dele mas sim de mim, fiquei envergonhada. Uma de suas frases nas palestras de motivação que promove pelo mundo afora é essa - "a deficiência está dentro de nós".
Eu entendi, lendo mais algumas frases suas, que a salvação está dentro de nós, assim como a destruição.
Como pode um ser perfeito, com todos os membros e sentidos, ter pena de alguém que está dando aulas de felicidade? E esse menino teria todos os motivos para não querer viver...
No entanto nos mostra com sua incrível tenacidade, que "nada na vida deve ser temido, apenas compreendido".
Não é para sentir vergonha de meus pequenos problemas, dentro desse meu mundinho?
Não estou com isso apontando ou taxando pessoas de egoistas. Não...estou dizendo que as vezes somos teatrais, nos desesperamos por um problema que no dia seguinte já nem é mais tão importante. Já passou, página virada, tudo já foi resolvido.
Então porque não permitirmos que o "nosso poder" - aquele que dorme dentro de nós -  fale ao nosso coração?
Já li várias vezes sobre a força da mente, o pensamento otimista, a tão discutida "fé", que não é mais do que você desejar ardorosamente que algo aconteça. E de tanto você desejar acaba acontecendo!
Você atrai coisas positivas quando pensa com alegria e entusiasmo. E negativas quando se lamenta e deseja ficar em um canto, esquecida, chorando.



Tenho por hábito ser feliz. Vi em mim, em alguns momentos em que fui colocada à prova, uma mulher forte.
Mas...não poucas vezes entro em pânico por motivos medíocres, preocupaçoes corriqueiras, dúvidas frequentes.
Sei que muitas pessoas são assim, deficientes por dentro, sem força para usar sempre seu poder, seu entusiasmo.
Toda a alegria que emana de uma pessoa em paz consigo mesma fará com que seja sempre lembrada com alegria. Veja do que me recordei agora:  uma frase de Mario Quintana, meu poeta favorito:

     -que importa restarem cinzas,
       se a chama foi bela e alta?"

Não estou promovendo aqui um show de inconsequência, leviandades que trarão mais dores e mais noites sem sono. Falo de levar a sério apenas o que realmente é sério, deixando de sofrer por coisas pequenas.
Conseguir passar para os jovens uma imagem de sabedoria, de respeito e muita vontade de dar certo.
Espero ter conseguido passar um pouco do turbilhão que virou minha alma ao ver o jovem Nick, tão bonito e feliz apesar de toda sua deficiência exterior.
É para ele que vai meu brinde de hoje, e também para meus amigos queridos, que têm a paciência de ler esses meus esparramos de emoções.
Plante belas sementes, criteriosamente escolhidas, dentro de suas possibilidades e de sua fé, para colher o melhor que a terra pode lhe dar: - tranquilidade.
Tim-tim e bons pensamentos para que consigamos transmitir no olhar a alegria de viver essa vida bandida.
Saúde!

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Flores amarelas




Está tudo errado, pelo menos para mim, está tudo muito errado! Finados não deveria ser um dia triste, cheio de orações e lágrimas. Em minhas pesquisas pelo Google conheci uma festa linda que os mexicanos promovem no dia dos mortos. É uma tradição indígena, uma festa tradicional e muito popular.
Lá é tradição festejar e não chorar pelos que se foram. Segundo crêem, nesse dia as almas estão entre nós para visitar seus familiares e portanto, é dia de alegria. Usam fantasias engraçadas, fazem doces, mesas bem arrumadas e fartas, tocam musicas alegres e brincam muito. As crianças adoram comer doces em formado de caveirinhas, e têm um relacionamento feliz com a data, dançam e cantam músicas dedicadas ao dia.
É lindo saber que se as almas de nossos queridos mortos podem voltar para ver a familia, seja feita uma festa para recebe-los. Imaginem voltar para casa em visita e encontrar todos chorando, musicas fúnebres, orações e roupas escuras. Eu não gostaria!
Os mortos que se foram há varios anos devem adorar voltar para suas casas no México e conhecer os netos, bisnetos, ver os filhos mais envelhecidos, bem sucedidos, felizes.
Tem alguma coisa errada com o finados que estamos acostumados. Eu adorei a idéia de implantar no Brasil o mesmo modo de comemorar lá do México.
Sei de pessoas que vão odiar  - é muito mais interessante chorar - mas também sei de outras que, como eu, adoram comemorar alguma coisa, encher uma mesa de guloseimas, reunir as crianças, dançar e beber.
E juro que conheço mortos que iriam amar voltar para casa e ver alegria, as crianças sorrindo, música bem alta - e a familia falando em seu nome com saudade, contando historias engraçadas, lembrando momentos bons.
Não seria mais divertido? Os mortos de minha familia iriam adorar!
Eram todos festeiros, alegres, falavam alto, diziam palavrões e - sobretudo - odiavam o assunto "finados".
Até nossa querida e pequena Tati, que nos deixou tão cedo, era uma pimentinha que gravou em nós a imagem da alegria e da expontaneidade, da facilidade em aprender palavrões, do riso alto, do prazer em ouvir músicas e dançar.
Sua gargalhada  até agora ressoa em nossos ouvidos e sei que ela sentiria muito prazer em nos ver  alegres, comemorando sua visita.
Pensem bem, meus queridos, e vejam se não é chegada a hora de sair às ruas, começar uma campanha por um finados mais feliz. Vamos realizar passeatas, mandar e-mails aos amigos, arrumar horários gratuitos na tv,  pois quem sabe conseguimos mudar a cabeça das pessoas desse nosso Brasil tão sofrido.
E pensar que seria um investimento muito bom para nós também, afinal, quando fizermos a tão longa viagem da qual ninguém escapa, partiríamos mais felizes ao saber que nossa familia nos aguardará com festas, música e alegria.
E tem mais, seremos lembrados como os grande transformadores - que divertido! - que se não puderam mudar o destino desse país, num feridão de finados, pelo menos mudaram a "vida" de seus "mortos".
Pensem nisso...
Ah... porque flores amarelas? porque é com elas que gostaria de ver a mesa arrumada nos dias de minhas visitas. São lindas.

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

algodão doce




Meus avós, pais de minha mãe, eram pessoas muito pobres. Ele veio da Italia, entre 1905 e 1910. Embarcou em um navio no porto de Veneza, filho de agricultores, como muitos que vieram depois da abolição dos nossos escravos. A familia viveu e trabalhou em uma fazenda na região de Campinas. Ela, nasceu em uma fazenda em Campinas, filha de imigrantes italianos. Ambos trabalharam na lavoura de café e de cana e quando se casaram  tiveram sete filhos - pelo menos eu creio que foram sete.
Desconheço maiores detalhes, o que é uma pena. Entendo que o fato de mamãe ter falecido muito cedo causou essa falta de maiores informações, pois ela deixou de nos contar fatos importantes.
Naquela época não havia aposentadoria para o trabalhador rural. Quando ficavam velhos, ficavam também sem rendas, dependendo de filhos ou prestando pequenos serviços para sobreviver. Havia muita dignidade na pobreza de então. Obviamente não haviam favelas, o pobre vivia em casas muito modestas, precariamente mobiliadas, geralmente pagavam aluguel.
Enquanto jovem, vovô trabalhou na terra. Mais tarde, já na cidade, procurando vida melhor para os filhos, trabalhou em uma olaria, serviço pesado, úmido.  Quando a velhice bateu à sua porta, deixou a olaria e fazia jardins, cuidava das flores, gramas, plantava árvores. Como o dinheiro era pouco, resolveu melhorar a renda vendendo pipoca em um carrinho que estacionava em frente às escolas, igrejas, praças. No tal carrinho haviam doces também, e me recordo que em certa ocasião, ele fazia algodão doce. Não me lembro bem da ordem das coisas.
O que me lembro é que ele era um encanto de velho. Olhos de um azul tão claro, que olhando de longe pareciam brancos. Sempre de camisa de algodão, sem colarinho, abotoada no pecoço. As calças remendadas por minha avó, davam a impressão que iam cair - ele as usava sem cinta - alpargatas no pé...
Aos domingos, para ir à missa, a camisa branca, calça listrada de preto e cinza, paletó preto, sapatos.
Era sempre a mesma roupa aos domingos. Tenho certeza de que não havia outra.
Quando mamãe faleceu ele continuou nos visitando aos domingos. Era uma delicia ve-lo chegar a pé  - e era bastante longe - sempre depois da missa, bolsos cheios de balas, sorriso delicioso de dentes perfeitos, invejáveis naquela idade. Sentava os menores no colo, perguntava sobre tudo, brincava de cavalinho, sanfoninha, ria alto, abraçava.
Mesmo quando meu pai casou-se novamente ele continuou indo aos domingos de manhã. Acredito até que minha irmã, filha de minha madrasta, lembra-se dele.
Apenas um problema:- gostava de beber. Só bebia vinho, em qualquer ocasião. Naquela época os bares serviam vinho no balcão e como vovó não deixava que ele levasse a bebida para casa, tomava no bar, e chegava em casa, invariavelmente, bêbado. Era um bêbado divertido, que ria de tudo, inclusive das broncas da mulher, o que deixava vovó furiosa.
Pronto, cheguei onde estava querendo chegar. Como minha avó administrava com mão de ferro as finanças da casa, controlando tudo o que entrava com a venda dos doces e os trabalhos nos jardins, meu avô descobriu uma maneira de beber seu vinho sem ter que pedir dinheiro a ela.
Quando andava pelas ruas da cidade, pegava papel e  papelão achado pelo caminho, dobrava e carregava amarrado nas costas. Vendia esse papel em um depósito e com o dinheiro bebia vinho no bar.
Eu, com apenas 15 anos trabalhava nos escritorios de uma grande empresa da cidade.  Os menores podiam e deviam começar a trabalhar cedo, e comigo não foi exceção. Um dia, de minha mesa de trabalho, ouvi comentários e risos dos rapazes desenhistas, que tinham suas pranchetas ao lado das janelas do salão.
Curiosa saí para dar uma olhadinha e vi meu avô lá embaixo - estávamos no primeiro andar -  com um punhado de papelão amarrado às costas e tentando pegar uma caixa vazia que teimava em rolar com o vento.
Os rapazes riam e comentavam - olha o sacrificio do velho!
                                                 - coitado, já não tem idade para isso...
                                                  - não tenha pena, deve ser para beber pinga!
E eu, no alto dos meus 15 anos, virei-me e voltei para minha mesa.Se ficasse mais algum tempo observando talvez ele olhasse para cima e me visse, talvez acenasse... para mim teria sido muito humilhante dizer que era meu avô. Não tive coragem, fui covarde e infantil.
Nunca esqueci essa imagem, nunca contei para ninguém. Hoje resolvi escrever porque já me perdoei.
Eu não tinha maturidade para encarar os meninos naquele dia, e nem para contar para a familia ou amigos depois de anos.
Sei que ele me perdoaria rindo e me dando um puxão de cabelo ou um tapa na bunda. Era sua maneira de dizer "te amo", aquele amor sem cobrança, sem broncas, sem presentes, mas enorme como seu sorriso.
Eu precisava do MEU perdão e esse é muito mais dificil, mais dolorido.
Vovô faleceu de uma doença decorrente da bebida.  Ele tinha uns sessenta e seis anos, eu dezessete. Ficou uma saudade doce, suave, alegre, como os algodões-doces que a gente comia e se lambuzava diante de seu carrinho que tinha uma lamparina de azeite para clarear por dentro. Velho lindo e feliz, é assim que me lembro de você...um brinde com o melhor vinho italiano,  pela tranquilidade dessa neta que ainda te ama. Tim-tim......

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

A Igreja




Ainda ontem lembrei-me que devia falar mais sobre o Padre Rafael, que no final dos anos 50 e durante os anos 60, foi o responsável pela Igreja Imaculada Conceição, no nosso bairro, em Osasco.
Se houve alguém que realmente se preocupava com as crianças do bairro, foi o nosso temido P. Rafael. Tinha um mau humor de leão, chamava todas as meninas de mariazinha e os meninos de zézinho. Dava broncas inesqueciveis durante a missa se algum engraçadinho (e sempre tinha um) resolvia desencadear uma crise de risos entre a garotada.
Nós, as crianças da Cruzada Eucarística, nos sentávamos nos primeiros bancos, fita com medalha no peito, vestindo nossas melhores roupinhas de domingo e uma vontade louca de olhar para os lados, procurando um motivo,  "unzinho" apenas para cair no riso. Parecia praga! era só a gente se acomodar no banco que dava uma vontade danada de rir.
E o P. Rafael interrompia a missa, olhava para o nosso lado (todos segurando o riso) e perguntava com seu vozeirão de tenor:- "onde está a graça? podem falar, quero rir tambem!".
Se uma criança de colo chorava durante a cerimonia, ele virava-se para a mãe e dizia: - "dona maria, saia lá para fora com a criança! você não assiste a missa e nem deixa os outros assistirem!".
Nos fundos da igreja havia o salão paroquial, com chão de cimento rústico, alguns bancos e um palco improvisado onde os jovens rapazes e moças,  ensaiavam algumas músicas ou peças de teatro, exibidas aos domingos, depois da missa das sete da noite.
Durante a tarde de domingo a garotada já  ensaiava para o "show" dos calouros,  e era muito divertido ver aqueles meninos e meninas apresentando-se no palco.
Eu tambem cantei algumas vezes, e hoje penso que se agora canto mal e sou desafinada, como seria então diante de várias pessoas, num palco! no entanto, as pessoas aplaudiam , se divertiam, coitados...ninguém gritava "socorro!"
O Edison, meu irmão, tinha o apelido de "pirulito". O apresentador dizia:- vem cá pirulito, vai cantar o que pra gente?e ele respondia, todo pimpão:- pirulito que bate-bate...
Era uma criança, de nove ou dez anos, e todos os domingos subia ao palco para cantar - "pirulito que bate-bate...pirulito que já bateu...quem gosta de mim é ela...quem gosta dela sou eu"... e por aí afora.
E apesar do eterno repeteco, aplaudiam e incentivavam o menino que queria apenas participar, ser visto e aplaudido. Até hoje, meio século depois, ele ainda é meio exibido.
A melhor comida quem faz é ele, a melhor batida é a dele, e adivinhem quem dança melhor?.... Esse é o nosso pirulito, irmão querido e peça importante de nosso quebra-cabeças.
Voltando ao P. Rafael, era um homem sempre à frente de seu tempo, um empreendedor. Fundou uma escola profissionalizante no terreno baldio ao lado da igreja.  Com a ajuda das grandes empresas da cidade, que ele visitava constantemente pedindo maquinas e equipamentos, conseguiu até professores para ensinarem os meninos nas horas vagas.
Nessa escola os meninos e meninas faziam cursos de eletrica, mecanica, solda, tornearia. Havia tambem artezanato, pintura, costura, enfim, uma oficina para futuros trabalhadores que seriam aproveitados pelas empresas ou pelo comercio da cidade.
Dele apenas sei que alguns anos depois foi designado para a Matriz da cidade, posteriormente sendo tranferido para Curitiba como Monsenhor. E  agora encontra-se em Itu,  segundo um amigo que mora em Osasco e encontrou-se com ele.
Foi uma das figuras mais interessantes que ja conheci. Hoje, ao ler algo sobre padres pedófilos, que desrespeitam crianças entregues em suas mãos - que deviam proteger -  lembro-me dele com imenso carinho.
Nunca soubemos ou vivemos qualquer situação constrangedora. Ao contrario,  nos ensinou a viver em comunhão, dar valor ao companheirismo e ao trabalho.
Minha lembrança é desse homem serio, alto, rosto bonito e bondoso, apesar do humor azedo e da voz grave e assustadora. Fiquei feliz em saber que está com saúde, descansando de uma vida plena de boas atitudes.
Ao amigo P. Rafael desejo o sono dos justos, o repouso merecido pelos grandes homens que souberam plantar amor no coracao das crian;as que o rodearam. Minha gratidão e minha saudade, pois foi com você que aprendi que a igreja pode e deve ser muito maior que uma missa ou que os sacramentos. A igreja deve ser sempre uma casa alegre onde somos bem vindos, amparados,  onde as crianças podem brincar e aprender, onde mora o respeito e o carinho entre as pessoas. Infelizmente, nessa minha caminhada,  nao encontrei essa acolhida em nenhuma outra paróquia que frequentei. Que pena!

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Juliana


Sempre que conversamos sobre o assunto, é com muito bom humor, e ela entende que não há maldade no que digo. Foi uma criança não planejada, uma gravidez que não estava nos planos e que me fez ficar apavorada.
Os dois mais velhos estavam já crescidinhos quando ela resolveu dar o "ar da graça", e eu chorava e não acreditava que ia começar aquela maratona toda novamente.
Os irmãos até hoje brincam dizendo -"você nem era pra ter nascido! o que você quer?"  - e esse assunto sempre acaba em gargalhadas, sem grandes traumas.
Quando nasceu,  meu pavor foi ao contrário, sentia muito medo de ser castigada por não ter aceito tranquilamente o inicio da gestação, rezava muito e com o tempo entendi que os céus não castigam, presenteiam.
Foi uma criança linda, calma, dorminhoca, e enquanto crescia "pentelhava" os irmãos que se irritavam com sua voz aguda e suas crises de caçula mimadinha.
O avô portugues mimava tanto que causava ciumes até na vovó, o que a levava a paparicar muito mais os dois maiores ao invés do bebê.
E foi assim, sem grandes sobressaltos, que se passaram esses anos, e ela transformou-se nesse mulherão, querida por todos, mãe em tempo integral, sensível e alegre.
Companheira para todas as horas, amiga e irmã carinhosa. Ela costuma brincar (será?) dizendo que seus medos e neuras são efeitos da  rejeição no útero, e nós retrucamos dizendo que são consequências do amadurecimento, da falta de mimos e agrados que teve na infância.
Hoje é seu aniversario, Juliana, e o que posso desejar de diferente para uma filha querida? O que será que ainda não disse para você, o que será que eu poderia falar de novo, de criativo?
Minha parceira de alegrias e lágrimas, de mesas fartas e cerveja gelada, de crianças chorando e precisando de atenção, de sobrinhos que chegam e saem, assim como os irmãos queridos.
Que sua vida seja sempre assim, cheia de trabalho e correrias, para que você nunca sinta saudade, seja sempre feliz e plena, com saúde e muito amor.
Um brinde à amizade, que é o sentimento mais nobre que existe. Saúde...tim-tim!




quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Basta um olhar



 
Meu filho entrou na sala de casa, repleta de crianças brincando e mulheres conversando e disse:- mãe, vem aqui um pouco, quero te mostrar uma coisa no computador. Ele me contou sobre uma música que tem ouvido bastante ultimamente, falou-me do grupo de nome Lynyrd Skynyrd, contou que vários integrantes desse grupo morreram em um desastre aéreo no ano de 1977.  Meu filho curte muito músicas dos anos 60, 70 ou 80, gosta mesmo de rock, pesquisa e sabe quase tudo sobre o assunto. Já andei comentando que me impressiono ao notar que meus filhos, que nasceram nos anos 70 (em 1976 eu já tinha os três), adoram ouvir as músicas que tocavam desde os anos dourados até agora. Isso significa que tinham qualidade mesmo.
Mas, desviei-me do assunto. Dando alguns cliques ele me mostrou a tradução da música que tocava, porque não falo inglês. Mostro para vocês o refrão e outros versos:

-o título é Simple man (homem simples)

-mamãe me disse quando eu era jovem
  venha sentar-se ao meu lado, meu filho,
  e escute com atenção o que eu digo
  e se você fizer isso, irá lhe ajudar em algum belo dia

-leve seu tempo, não viva tão rápido,
 dificuldades virão e passarão
 vá, encontre uma mulher e encontrará o amor
 e não esqueça filho, há alguém lá em cima...

-Refrão:
 Seja um tipo simples de homem
 Seja algo que você ame e entenda
 Você não que fazer isso por mim, filho?
 Se você puder?

-esqueça seu desejo pelo ouro do homem rico
  tudo aquilo que você precisa está em sua alma
  e você pode fazer isso se você tentar
  tudo aquilo que eu quero para você
  meu filho
  é estar satisfeito
- menino, não se preocupe...você se achará...

No momento a casa estava muito barulhenta, as crianças vieram ver também no computador, xeretas como sempre, perguntando, clicando onde não devem,  e eu não pude dizer a ele o quanto eu entendi aquele gesto de me mostrar a letra da música.
Mais tarde em silêncio, fiquei pensando que devia ter dito o que ele esperava ouvir, mas acredito que ele entendeu meu olhar.
Sempre conversamos muito e eu dizia a ele, com outras palavras, que ser simples é o segredo da felicidade. Que não adianta todo o ouro do mundo se você não coloca a cabeça no travesseiro e dorme em paz com você mesmo. E que eu esperava dele, e de minhas filhas, apenas que fossem dignos e conseguissem o suficiente para uma vida tranquila, sem sobressaltos.
Somos muito amigos, falamos sobre qualquer assunto,  como bons companheiros e não como mãe e filho. Passamos por momentos delicados, nos amparando para não cair em desespero, e hoje, basta um olhar, um único olhar para eu saber que ele se lembra de tudo.
Um dia falo mais sobre isso.
Um brinde ao olhar, aquele olhar que diz muito mais que mil palavras. Ao olhar que sorri, o que transmite emoção, o que fala sem dizer nada.
Hoje o brinde é com cerveja,  nossa bebida oficial para rir e bater papo. Adoro beber cerveja com meus filhos, jogar conversa fora, lembrar coisas boas. Certa vez li um artigo que dizia que o café aproxima as pessoas, traz aconchêgo. Aqui em casa é diferente. Não podia deixar de ser...tim-tim, saúde!

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Alegria




Quando vejo as propagandas ou videos dos maravilhosos circos internacionais que hoje visitam o Brasil, fico encantada com o espetáculo que produzem.  Nada de animais fechados em jaulas,  famintos e à beira de um ataque de nervos, andando sem parar, em circulos, como que procurando uma saída, qualquer uma.
São espetáculos lindos, coloridos, com artistas perfeitos e muito bem treinados. Fico realmente maravilhada, porque o circo sempre foi a forma mais próxima da alegria total.
Ver as crianças olhando um malabarista, um trapezista ou outro artista se exibindo, é um momento mágico. Os olhos brilham, o sorriso brota, as mãos já postas para bater palmas. Repare.
Mas a hora do palhaço é a preferida. Até hoje, empoleirada na arquibancada da vida, já atingindo as últimas tábuas, alegro-me muito com um palhaço, ou dois, ou muitos.
Havia um programa aos domingos, nos anos 50, na TV Record, sempre depois do almôço. Chamava-se Circo do Arrelia. Era programa obrigatório da criançada, espalhadas pela sala, aguardando a cortina que se abria para um mundo irreal.  Arrelia era o dono do circo, o palhaço "maior" o centro do show.
Apresentavam alguns números de malabarismo, trapézio, macacos. Tinha até teatro, com historias contadas com muita graça, muita ingenuidade. Agora...quando entrava o Arrelia, com seu ajudante e primo chato, o Pimentinha (o nome já diz como era chato) o circo ficava muito mais lindo, colorido, feliz!
As piadas, brincadeiras, bofetões, tombos, banhos de agua gelada, farinha de trigo espalhada até entre a platéia, faziam a nossa alegria e tornavam as nossas tardes de domingo muito mais interessantes.





Arrelia viveu muitos anos, morreu velhinho e respeitadíssimo por todos que gostavam de sua arte.
Acredito que meus irmãos mais novos não tiveram a sorte de assistir ao circo, apenas eu e o Edison, os mais velhos. Esses programas de auditório foram substituidos por desenhos animados, muito bons, ou série de filmes que nos transportavam para um mundo que não era o nosso.  Era um mundo americano, fácil e lindo, que os deixava sonhando em ser o Cabo Rusty, dono de Rin-tin-tin, ou quem sabe o menino que tinha uma cachorra chamada Lassie? e muitos mais que não me ocorrem agora.
Mas as palhaçadas do Arrelia nas tardes de domingo ficaram para sempre gravadas em meu coração. Até hoje fico emocionada quando vejo um palhaço, mesmo que seja na porta de uma loja, feio e sem brilho, distribuindo balas e convidando as mães para verificarem os preços.
A alegria da garotada de hoje é bem diferente mas não menos inteligente e interessante. Quisera eu ter um computador a minha disposição quando tinha 7 ou 8 anos. Pistas de patinação no gelo, pula-pula na cama elástica...isso é muito bom, e vejo a mesma alegria nos olhos das crianças de agora.
Nós dois, os irmãos mais velhos, trocamos o cirquinho na TV pelo novo modismo da época, a matinê nos domingos à tarde. Era sensacional trocar de roupa, encontrar com os amigos na rua de casa e ir à pé até o cinema que ficava bem perto. O programa era sempre um filme voltado para as crianças, um intervalo, e um capitulo do seriado. Não perdíamos um domingo, para desespero de meu pai, que nem sempre estava em condições de pagar nosso cineminha. Fazíamos um berreiro, saíamos correndo falando que não precisava de dinheiro, que a gente ia sem ele mesmo. E papai acabava cedendo, ou acabávamos de castigo por alguns domingos, dependendo do humor dele. Tudo isso antes de eu completar dez anos, quando ainda morávamos no centro.
A mudança para o bairro acabou também com essa nossa alegria, restando apenas os programas que o Padre de nossa Igreja sempre inventava para distrair as crianças da Cruzada Eucarística.
Outro dia volto a esse assunto, falando sobre os programas que o Padre Rafael criava para nos divertir e ensinar a viver em comunidade. Vai dar um capítulo e tanto, tenho certeza.
Aos palhaços maravilhosos que alegravam os domingos de minha vida de menina que, apesar das privações e carências, foi uma infância feliz, eu levanto um brinde de agradecimento e saudade.
Ser criança é sempre a mesma coisa, antigamente ou hoje, o que mudou foi o mundo. A inocência nasce com as pessoas, o mundo é quem a deturpa, ou respeita. Eu pertenço ao segundo grupo.
Tim-tim!
 




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quarta-feira, 13 de outubro de 2010

O caminho das pedras






Para quem conhece bem a região existe uma faixa de pedras, eu não sei explicar a origem, que atravessa Votorantim, passa por várias cidades, inclusive Itu e Salto, e passa por Valinhos, pelos lados da estrada que nos leva a Itatiba. Por várias vezes, quando passeava com meu marido, ele citava essa coincidência de ter nascido em Votorantim e morar em Valinhos, onde pode-se ver também esse amontoado de pedras de todos os tamanhos e formatos. Acredito que o Luiz procurou se informar, ou leu mapas, para saber que era o mesmo caminho de pedras que vinha de sua cidade até aqui.
Essa vida nos prepara grandes surpresas, algumas tão impressionantes que ficam dificeis de serem explicadas.
Essa época do ano é especialmente complicada para mim, porque no dia 15 de outubro, portanto depois de amanhã, serão cinco anos sem meu companheiro, e sem o seu amor.
O que falar sobre uma união de trinta e oito anos? Dizer que foi tudo perfeito, nunca brigamos, nunca nos dissemos verdades doloridas? Bobagem, sabemos perfeitamente que isso é impossivel.
Dizer que nunca tive momentos ruins, vontade de ir embora, lágrimas de dor?  Grande mentira, é lógico que tive.
Mas teria tudo novamente,  só porque os momentos de alegria foram muito maiores. As horas de companheirismo, de cumplicidade e de carinho foram infinitamente maiores. Tive o privilegio de ter ao meu lado um homem apaixonado e amigo, companheiro até os últimos momentos.
Aos poucos vou falando sobre nossa relação, nossa historia bonita, nossos sonhos e planos, alguns concretizados, outros não, apenas porque não tivemos tempo.
Ele se foi muito cedo,  tínhamos ainda muita historia para viver e depois contar para nossos filhos e netos.
Pobres filhos e netos que não terão mais sua companhia, e pobre de mim que sinto muita saudade.
O sentimento maior que ficou, como sempre digo, foi de pena, uma pena imensa que sinto por ele estar perdendo esse espetáculo da vida que nossos netos e filhos representam.
Ainda anteontem, em Ubatuba, em companhia de meus irmãos, ouvi uma música antiga que dizia assim - "...que quem morreu fui eu e foi você, pois sem amor, morremos sós, morremos nós..." .
Naquele momento eu chorei, sentindo uma saudade tão grande, um peso massacrante me sufocando, tirando meu ar, meu chão. Mas foi muito rápido, e a dor assim como veio foi embora e eu fiquei ali admirando aquele mar azul e enorme aos meus pés,  um presente lindo da natureza que me fez pensar que nada, nada mesmo mudaria se eu chorasse o dia inteiro ou a vida inteira até me cansar.
As palavras sobre a concentração de pedras com as quais começei a postagem tem uma razão de ser.  Por um motivo absurdo e totalmente inexplicável foi à beira de uma estrada, sobre essa região pedregosa e em frente a um sitio onde se lia "ninho das pedras", que numa madrugada chuvosa e escura eu me despedi de meu Luiz, companheiro da minha vida.
Por agora acredito que basta, porque não é de meu feitio falar de despedida, e sim de chegadas e de saudades, e de alegrias.
Minha vontade foi apenas deixar registrada essa coincidência enorme que fez um chão de pedras ser o berço de meu marido nos dois opostos de sua vida.
Quero contar muito mais de nossas vidas, do namoro, do nascimento dos filhos, das nossas infinitas alegrias e preocupações. Vou falar de tudo isso e muito mais para que todos entendam o porque da enorme saudade que sinto dele.
E porque não levantar um brinde para o passado? Vamos lá... taças à mão e sorriso nos lábios brindando e agradecendo a alegria de ter um passado digno de ser contado e dividido com todos. Tim-Tim!!!




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